Agência Estado
Data: 13 de agosto de 2002
Cerveja pode fazer bem à saúde, indicam pesquisas
Pesquisas indicando que o consumo de cerveja pode trazer alguns benefícios
para a saúde levaram a Associação Nacional dos Varejistas de Cerveja
dos EUA e a AmBev, no Brasil, a adotar um novo lema: cerveja é saúde.
A entidade norte-americana chegou a organizar um seminário e a divulgar
comunicado dizendo: "Tenha alimentação equilibrada, faça exercícios
e beba uma cerveja por dia para evitar doenças." O alvo é a fama
do vinho tinto de ser um protetor do coração.
Dois estudos recentes serviram de estopim para a onda da cerveja saudável.
Um deles acompanhou 70 mil enfermeiras e mostrou que as que bebiam
cerveja eram menos hipertensas do que as que consumiam vinho e
destilados. A outra avaliou mais de 120 mil homens e concluiu que os
consumidores de cerveja apresentavam risco menor de doença coronariana
que os bebedores de vinho e destilados. Tudo isso em termos de consumo
moderado, uma cerveja por dia.
Boa notícia para os fabricantes, num mercado que só nos Estados
Unidos movimenta US$ 55 bilhões por ano. Como não podem pôr nos rótulos
que cerveja faz bem, as associações partiram para um marketing
diferente, com apelo à saúde. A maioria das pesquisas compara cerveja
e vinho. Nenhuma compara quem bebe e quem não bebe. Até mesmo Julie
Bradford, editora da revista "All About Beer" ("Tudo
sobre Cerveja"), com 25 mil assinantes, mostra uma certa cautela.
"A gente não está dizendo que a cerveja é uma droga milagrosa
nem sugerindo que as pessoas bebam duas latinhas por dia para ter saúde",
diz.
Há questionamentos sobre as virtudes que a cerveja teria para a saúde,
entre elas o fato de conter vitaminas do complexo B e de reduzir os níveis
de homocisteína, uma proteína que, em grandes quantidades, está
associada ao risco de enfarte. Mas o professor Eric Rimm, da Escola de
Medicina de Harvard, diz que os efeitos benéficos do álcool e qualquer
outra bebida são decorrentes do etanol, que é um anticoagulante como o
ácido acetil-salicílico.
Etanol
O problema é que a cerveja tem baixo teor de etanol e precisaria ser
consumida em grandes quantidades - que são prejudiciais - para causar
esse efeito.
Mas mesmo os especialistas que endossam esses trabalhos reconhecem
que nos EUA e por aqui o consumo está longe de ser moderado: basta um
jogo de futebol, americano ou não, para o número de garrafinhas ou
latas disparar para uma média de meia dúzia por partida. E isso põe o
consumidor em maior risco para obesidade - que pode causar enfarte,
diabetes e outros problemas.
"É preciso tomar muito cuidado com associações estatísticas,
porque estatisticamente pode-se provar até que TV a cabo aumenta o
risco de enfarte", diz o presidente da Sociedade Brasileira de
Cardiologia, Juarez Ortiz. Sabe-se, por exemplo, que fumar faz mal para
o coração porque há um número bem maior de enfartados fumantes do
que não fumantes. Mas há uma enorme distância entre constatar que um
número maior de enfartados usava camisa azul-clara quando sofreu um
ataque e concluir que camisas azuis causam enfarte.
"Não existem evidências científicas de que cerveja faça bem
para o coração, tanto que nenhuma sociedade de cardiologia do planeta
recomenda o consumo da bebida como forma de prevenção", garante.
De acordo com ele, é até possível que pessoas que consumam cerveja
tenham menos risco, não por causa da cerveja, mas do estilo de vida
mais relaxado, com menos estresse.
Ele recomenda cautela diante dessas alegações. Ortiz lembra que a
crença muito difundida de que suco de berinjela com laranja baixava
colesterol foi motivo de pesquisa da entidade, que descartou como puro
mito. "A única forma de obter informação correta é recorrer às
associações, que têm dados especialmente organizados para
leigos", diz. O site da sociedade é www.cardiol.br.