The New York Times
Data: 24 de setembro de 2002
Aspirina pode salvar
vidas em pós-operatório
Denise
Grady
The New York Times
Dar aspirina aos pacientes nas primeiras 48 horas após cirurgia de
ponte de safena pode reduzir grandemente o risco de morte. Reduz também
o risco de complicações sérias envolvendo coração, cérebro, rins e
trato digestivo.
O estudo, que envolveu 5.065 pessoas, pode mudar a prática médica,
disseram médicos que não participaram da pesquisa. Segundo eles, a
pesquisa forneceu fortes evidências que os pacientes de ponte de safena
devem tomar aspirina o mais cedo possível depois da cirurgia.
No entanto, pessoas alérgicas à aspirina, com distúrbios hemorrágicos
ou úlceras não devem tomar a droga, disseram os médicos.
Diversos grupos já recomendam o uso de aspirina logo após cirurgia de
ponte, porque ajuda a impedir o bloqueio dos vasos remendados. Essas
diretrizes, no entanto, nem sempre são seguidas, porque muitos médicos
temem dar aspirina cedo demais após a cirurgia e causar séria
hemorragia. O novo estudo, não encontrou esse problema.
Em 1999, 355.000 americanos foram operados com ponte de safena, de
acordo com a Associação Cardíaca Americana. A cirurgia envolve o
implante de novos vasos sangüíneos no coração, para ultrapassar
bloqueios nas artérias coronárias que levam sangue ao coração.
Os autores do novo estudo estimam que o uso de aspirina logo após a
cirurgia poderia salvar 8.000 vidas por ano, só nos EUA.
O estudo está sendo publicado na revista The New England Journal of
Medicine de quinta-feira. Segundo seus resultados, sem a aspirina, o
índice de mortalidade depois da cirurgia era de 4%, entre os pacientes
ainda no hospital. Com a aspirina, o índice de mortalidade passava para
apenas 1,3%. Reduções igualmente significativas foram encontradas nos
riscos de ataque cardíaco, derrame, insuficiência renal e dano aos
intestinos causados por fluxo sangüíneo reduzido.
O uso da aspirina poderia ter duas vantagens no pós-operatório:
impedir a formação de coágulos sangüíneos e reduzir a inflamação
dos vasos sangüíneos. A inflamação aumenta muito depois da cirurgia
e pode contribuir para um excesso de coágulos e danos aos órgãos.
Aspirina funciona desativando as plaquetas do sangue, que têm um papel
importante nos processos de coagulação e inflamação.
As pessoas com alto risco ou que já tiveram ataques cardíacos,
normalmente, são aconselhadas a tomar uma dose pequena de aspirina.
Para prevenir ataques cardíacos e derrames, que muitas vezes são
causados por coágulos, tomam meia aspirina ou uma aspirina infantil
todos os dias.
No entanto, muitos médicos recomendam a esses mesmos pacientes pararem
de tomar aspirina antes da cirurgia. Muitas vezes, não voltam a receitá-la
no pós-operatório. O novo estudo revelou que pacientes que tomaram a
aspirina antes e depois da cirurgia tiveram melhores resultados do que
os que pararam de tomá-la ou nunca a tomaram.
Os pacientes analisados foram tratados em 70 hospitais de 17 países,
entre 1996 e 2000. O artigo foi escrito por Dennis T. Mangano, fundador
de uma organização sem fins lucrativos, que pagou pelo estudo, Fundação
de Pesquisa e Educação em Isquemia, em San Francisco.
Bruce A. Reitz, diretor de cirurgia cardiotorácica da Universidade de
Stanford, disse: "Acredito que (o estudo) mudará a prática média.
Fiquei realmente impressionado com a magnitude da mudança observada e
pelo fato de ter afetado várias possíveis complicações".
Em um editorial que acompanha o artigo de Mangano, Eric J. Topol,
cardiologista da Clínica Cleveland, escreveu que "o uso de
aspirina logo após a cirurgia de ponte de safena deve virar prática
padrão".
Robert Bonow, presidente da Associação Cardíaca Americana e chefe de
cardiologia da Faculdade de Medicina da Universidade Northwestern, disse
que "é um estudo amplo, e os resultados são muito, muito
significativos".
Bonow, entretanto, também aconselhou cuidado, porque o estudo não
tinha controle randomizado, considerado mais confiável. Nesses estudos,
os pacientes que recebem a droga são selecionados ao acaso. Depois, são
comparados com um grupo controle, que recebeu um placebo.
No estudo de Mangano, os pacientes que receberam aspirina não foram
escolhidos ao acaso. Os médicos decidiram quem receberia ou não a
droga, e os pesquisadores avaliaram os resultados. Esse tipo de estudo
sempre é suscetível a desvios.
Por exemplo, os médicos podem relutar em receitar aspirina para
pacientes mais doentes. Seu resultado pior posterior poderia estar mais
relacionado com sua doença do que com a falta da aspirina. Em outra hipótese,
médicos que recomendam o uso de aspirina podem ser mais progressistas
que os que preferem não utilizá-la. Seus pacientes podem estar
recebendo maior atenção em geral, fato que explicaria as diferenças
entre os grupos.
Mangano disse, porém, que sua equipe tinha comparado cuidadosamente os
registros dos pacientes estudados. Ela não descobriu diferenças que
explicassem porque os que tomaram aspirina saíram-se melhor que os
outros.
Bonow disse que, mesmo assim, seria boa idéia fazer um estudo de
controle randomizado. No entanto, admitiu que seria muito difícil
encontrar pacientes dispostos a ser escolhidos ao acaso. A maior parte não
gostaria de ficar no grupo de placebo, especialmente depois do estudo de
Mangano e dos benefícios conhecidos da aspirina para cardíacos.